Um Senhor de Engenho holandês na Paraíba.
Engenho da Resistência
Próximo às margens do Rio Una encontra-se o Engenho Gargaú. No início do século XVI este engenho pertenceu a Ambrósio Fernandes Brandão, autor da celebre obra “Diálogo das Grandezas do Brasil”. Desde as primiras tentativas da invasão holandesa a localidade, em 1631, o engenho foi local de resistência das forças luso-brasileiras, abrigando, inclusive, soldados e civis durante o conflito. Quando finalmente os holandeses conseguiram o controle da capitania em 1634, Jorge Lopes Brandão, filho de Ambósio Fernandes e herdeiro do Engenho Gargaú, partiu em retirada deixando abandonando a propriedade. Anos mais tarde, em 1635, o engenho não moía, pois, se encontrava “em parte arruinado”.

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Volta produção do Açucar
Em 1637, dada a trégua dos conflitos e a tentativa de retomada da produção do açúcar, os holandeses confiscaram a propriedade e venderam para Isaac de La Rasière, um dos homens mais ricos a serviço da WIC na Paraíba. O engenho foi adquirido por 110 mil florins, em seis prestações anuais, passando o nome do engenho de Gargaú para Engenho La Rasière. Continuou sem moer em 1637 e 1639, embora dispusesse de um partido de lavrador de sessenta tarefas (3 mil arrobas), que as moía no engenho São Miguel Arcanjo, também pertencente a Rasière. Em 1640, foi incendiado por Vidal de Negreiros, “mas o fogo foi extinto”. Com a retomada dos conflitos entre holandeses e luso-brasileiros em 1645, o engenho foi abandonado. No entanto, entre 1654 e 1655, foi constatado no relatório do holandês Schoppe que o antigo engenho foi transformado em praça de resistência dos holandeses, sendo ali instaladas 3 peças de artilharia.

No local do antigo engenho encontra-se somente a antiga capela e ruínas da velha unidade produtiva. Em 2006 uma equipe da New Holland Foundation em expedição para encontrar e estudar a atividade dos holandeses pelo nordeste estiveram no engenho, não encontraram o forte, pois alegaram que a possível localidade do mesmo é de difícil acesso.
Biografia Ambrósio Fernandes Brandão
Nasceu em Lisboa (Portugal) em 1555 e falecei em Portugal por volta 1618, foi um senhor de engenho e escritor português, que viveu no Brasil Colonial entre os séculos 16 e 17 e deixou a célebre obra Diálogos das grandezas do Brasil, na qual narra sua estada em terras brasileiras.
Explorador-historiador
Cristão-novo perseguido pela Inquisição, Brandão estabeleceu-se na Paraíba, onde escreveu esses diálogos e onde também foi senhor de engenho, além de um dos feitores ou escrivães de Bento Dias Santiago de Pernambuco e Itamaracá. Capistrano de Abreu, a quem se deve a comprovação da autoria da obra, deu relevo aos aspectos humanísticos e científicos da narrativa de Brandão.
Acusação e viagem ao Brasil
Nascido em 1555, Ambrósio residiu em Lisboa e foi acusado da prática de judaísmo. Na denúncia consta que todas as pessoas de sua família eram letradas, desde a esposa, Ana, até a irmã, Joana Batista, e o filho, Duarte. Embora ele tenha sido denunciado perante a Mesa do Santo Ofício em 8 de outubro de 1591, não há, contudo, notícia de que tenha sido processado pela Inquisição.

Após a denúncia, ele viajou para o Brasil, onde viveu durante vinte e cinco anos, primeiro em Olinda (de 1583 a 1597), depois na Paraíba como senhor de engenho (de 1607 a 1618), segundo frei Vicente do Salvador narrou em seus escritos: «Antes de 1613 estabeleceu-se na Paraíba (…).
No Brasil, como cristão novo, Ambrósio foi denunciado pelo padre Francisco Pinto Doutel, vigário de São Lourenço, perante a Mesa do Santo Ofício, na Bahia, a 8 de outubro de 1591, acusado de frequentar a esnoga de Camarajibe.
Livro célebre
Engenho de cana-de-açúcar em Pernambuco, pelo pintor neerlandês Frans Post (século XVII). Ambrósio Fernandes foi senhor de engenho e encontrou esse tipo de paisagem na época em que viveu no Brasil.

Em 1618 ele conclui a obra Diálogos das grandezas do Brasil, cuja escrita em forma de diálogo era bastante comum na Europa desde a Renascença. Sobre tal obra, o historiador José Honório Rodrigues em seu livro História da história do Brasil teceu as seguintes considerações:
A crônica mais positiva, a descrição mais viva, o flagrante mais exato da vida, da sociedade, da economia dos moradores do Brasil.
Francisco Adolfo de Varnhagen descobriu o texto do livro na Biblioteca de Leida, nos Países Baixos, da qual fez uma cópia em 1874 que serviu para a publicação brasileira de 1930, por iniciativa da Academia Brasileira de Letras, com introdução de Capistrano de Abreu e notas de Rodolfo Garcia.

Num dos trechos do livro, confrontado pelo seu interlocutor do porquê de no Brasil haver tanta plantação de cana-de-açúcar, em detrimento de outras culturas, Fernandes Brandão relata:
(…) no Brazil seus moradores se ocupam somente na lavoura das canas-de-açúcar, podendo-se ocupar em outras muitas cousas. (…) a terra é disposta para se haver de fazer nela todas as agriculturas do mundo pela sua muita fertilidade, excelente clima, bons céus, disposição do seu temperamento, salutíferos ares e outros mil atributos que se lhe ajuntam.»
Tal obra só viria a ser formalmente publicada mais trezentos anos após escrita por influência do historiador Capistrano de Abreu.
Fontes
- MELLO, Evaldo Cabral de. O bagaço da cana. Engenhos de açúcar no Brasil Holandês. São Paulo: Penguin – Companhia das Letras, 2012, pp. 167-168.
- Costigan, Lúcia Helena.Through Cracks in the Wall: Modern Inquisitions and New Christian Letrados in the Iberian Atlantic World. Leiden: Brill, 2010.
- Lins, Guilherme Gomes da Silveira d’Avila. Levantamento das publicações dos Diálogos das grandezas do Brasil com algumas notas sobre o seu mais do que provável autor. João Pessoa: Empório dos Livros, 1994.
- Mello, José Antônio Gonsalves de. Gente da Nação: Cristãos Novos e Judeus em Pernambuco (1542-1654). Fundação Joaquim Nabuco – Editora Massangana, 1989.
- Mordoch, G. “Um cristão-novo nos trópicos: expansão imperial e identidade religiosa nos Diálogos das grandezas do Brasil de Ambrósio Fernandes Brandão”. Colonial Latin American Review, Volume 25, 2016 – Issue 2 (2016), 200-219 (acessado em 24/12/2017).
- Santos, Carlos Alberto dos. O olhar cristão-novo de Ambrósio Fernandes Brandão nos Diálogos das grandezas do Brasil. Dissertação de mestrado, Universidade de São Paulo, 2007.
- Silva, Kalina Vanderlei. “O sertão na obra de dois cronistas coloniais: a construção de uma imagem barroca (séculos XVI–XVII)”, Estudos Ibero-Americanos 32-2 (2006), 43–63 (acessado em 24/12/2017).
- Simões, Manuel G. “Dialogismo e narração nos Diálogos das Grandezas do Brasil”, em O olhar suspeitoso: viagens e discurso literário, Lisboa: Edições Colibri, 2001, 71–84.
- Windmüller, Käthe. “Omissão como confissão: Os Diálogos das grandezas do Brasil de Ambrósio Fernandes Brandão”, Inquisição: Ensaios sobre mentalidade, heresias e arte, organização de Anita Novinsky e Maria Luiza Tucci Carneiro, São Paulo: Expressão e Cultura – Edusp, 1992, 408–17.
- Autor Roberto Junio Martinasso Ribeiro – página facebook O Brasil Holandês 1630-1654